Uma das reflexões mais profundas que podemos fazer é sobre a efemeridade
de todas as coisas que envolvem nossa existência. Deus dispôs tudo de
modo que nada fosse sem fim aqui nesta vida. Qual seria o desígnio de
Deus nisso? Cada dia de nossa vida temos de renovar uma série de
procedimentos: dormir, tomar banho, alimentar-nos, etc. Tudo é precário,
nada é duradouro; tudo deve ser repetido todos os dias. A própria
manutenção da vida depende do bater interminável do coração e do
respirar contínuo dos pulmões. Todo o organismo repete sem cessar suas
operações para a vida se manter. Tudo é transitório… Nada permanente.
Toda criança se tornará um dia adulta e, depois, idosa. Toda flor que se
abre logo estará murcha, todo dia que nasce logo termina… E assim tudo
passa, tudo é transitório, Por que será? Porque tudo nesta vida é
passaheiro? Compra-se uma camisa nova, e logo já está surrada;
compra-se um carro novo, e logo ele estará bastante rodado e vencido por
novos modelos, e assim por diante.A razão
inexorável dessa precariedade das coisas também está nos planos de Deus.
A razão profunda dessa realidade tão transitória é a lição cotidiana
que Deus nos quer dar de que esta vida é apenas uma passagem, um
aperfeiçoamento, em busca de uma vida duradoura, eterna, perene.
Em cada flor que murcha e em cada homem que falece, é como se Deus nos
dissesse: “Não se prendam a esta vida transitória. Preparem-se para
aquela que é eterna, quando tudo será duradouro, e nada precisará ser
renovado dia a dia. “Isto mostra-nos também que a vida está em nós, mas
não é nossa. Quando vemos uma bela rosa murchar, é como se ela estivesse
nos dizendo que a beleza está nela, mas não lhe pertence. Quando vemos
uma bela artista envelhecer, é como se ela nos dissesse: “a beleza está
em mim, mas não me pertence”.
Com a precariedade da vida e de tudo o que nos cerca, Deus nos ensina,
diária e constantemente, que tudo passa e que não adianta querermos
construir o céu aqui nesta terra. Ainda assim, mesmo
com essa lição permanente que Deus nos dá, muitos de nós somos levados a
viver como aquele homem rico da parábola narrada por Jesus. Ele
abarrotou seus celeiros de víveres e disse à sua alma: “Descansa, come,
bebe e regala-te” (Lc 12,19); ao que Deus lhe disse: “Insensato! Nesta
noite ainda exigirão de ti a tua alma” (Lc 12,20).
A efemeridade das coisas é a maneira mais prática e constante que Deus
encontrou para nos dizer a cada momento que aquilo que não passa, que
não se esvai, que não morre, é aquilo de bom que fazemos para nós mesmos
e, principalmente, para os outros. Os talentos multiplicados no
dia-a-dia, a perfeição da alma buscada na longa caminhada de uma vida
de meditação, de oração, de piedade, essas são as coisas que não
passam, que o vento do tempo não leva e que, finalmente, nos abrirão as
portas da vida eterna e definitiva, quando “Deus será tudo em todos”
(cf. I Cor 15,28).
A transitoriedade de tudo o que está sob os nossos olhos deve nos
convencer de que só viveremos bem esta vida, se a vivermos para os
outros e para Deus, de acordo com Sua Vontade e suas Leis. São João
Bosco dizia que “Deus nos fez para os outros”. Só o amor; a caridade, o
oposto do egoísmo, pode nos levar a compreender a verdadeira dimensão
da vida e a necessidade da efemeridade terrena.
Se a vida na terra fosse incorruptível, muitos de nós jamais
pensaríamos em Deus e no céu. Acontece que Ele tem para nós “algo mais
excelente”, aquela vida que levou São Paulo a exclamar: “Coisas que os
olhos não viram, nem os ouvidos ouviram, nem o coração humano imaginou
(Is 64,4), tais são os bens que Deus tem preparado para aqueles que o amam” (1 Cor 2,9).
A corruptibilidade das coisas da vida deve nos convencer de que Deus
quer para nós uma vida muito melhor do que esta – uma vida junto d´Ele.
E, para tal, Ele não quer que nos acostumemos com esta, mas que
busquemos a outra, onde não haverá mais sol porque o próprio Deus será a
luz, e não haverá mais choro nem lágrimas, porque Ele mesmo as
enxugará.
Aqueles que não crêem na eternidade jamais se conformarão com a
precariedade desta vida terrena, pois sempre sonharão com a construção
do céu nesta terra. São os seguidores dos filósofos ou pensadores ateus
como Voltaire, Nietzsche, Fuerbach, Marx, Saramago, Freud, Sartre,
Kierkegaard e tantos outros que se incumbiram de fomentar o desespero
nas almas e até o suicídio, por não crerem em Deus. Esses não se
conformaram com a precariedade da vida e a achavam lamentável. Mas, para
os que crêem, para aqueles que a Luz de Cristo iluminou a sua vida, já
que “Ele é a luz que vindo a este mundo ilumina todo homem” (João 1, 9),
a efemeridade tem sentido: pois canta a Liturgia que “a vida não será
tirada, mas transformada”; o “corpo corruptível se revestirá da
incorruptibilidade” (1Cor 15,54) em Jesus Cristo.
São Paulo, falando aos filipenses, explicou tudo em poucas palavras:
“Nós, porém, somos cidadãos dos céus. É de lá que ansiosamente esperamos
o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo,
tornando-o semelhante ao seu corpo glorioso, em virtude do poder que
tem de sujeitar a si toda criatura.” (Fil 3, 20-21). E disse aos
corintios: “Semeado na corrupção, o corpo ressuscita incorruptível;
semeado no desprezo, ressuscita glorioso; semeado na fraqueza,
ressuscita vigoroso; semeado corpo animal, ressuscita corpo espiritual”.
(1Cor 15, 42-43) E ainda: “Se é só
para essa vida que temos colocado a nossa esperança em Cristo, somos, de
todos os homens, os mais dignos de lástima” (1 Cor 15,19).
Enquanto essas verdades não caírem no
fundo de nossa alma, e ali produzirem os seus frutos, não seremos
verdadeiramente felizes e realizados neste mundo. Mas também isso é
graça de Deus.
Prof. Felipe Aquino
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